gastura
- Maíra do Nascimento
- 19 de jun. de 2021
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atravessar-se desde cedo pela morte a permitiu a coragem de quem tem joelhos eternamente esfolados, em carne viva. sempre o sangue a jorrar, as mãos sujas a bulir no vermelho da coisa. e ela a enfiar o dedo com sangue na língua – gostava de sentir gosto ferroso, áspero, de lembrar-se viva.
acostumou-se a isso, a ter sangue na boca. como um sinal de vida, não de morte.
não tinha receio?
acostumou-se também a enfiar a cabeça no mar com violência pra limpar a alma, sem medo algum. atirar-se de cabeça e tudo, ela pensava, limpava mais profundo. não bastava um mergulho sutil, era importante acreditar no mar, se entregar a ele, confundir-se.
vida matéria tão fina, tão embalada pela ida.
aprendeu a gestar a si, ser pai, ser mãe, ser trinta gerações anteriores.
ela:
uma linhagem inteira do que restou
promessa do ainda virá
1 vestígio de futuro
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